27.4.10

Mais uma vez me desculpe

(...) Deixe-me te dizer uma outra coisa e depois basta.
Não quero ofendê-lo. A sua consciência, como você diz. Você não quer ser questionado. Eu tinha esquecido disto, desculpe. Mas eu reconheço, reconheço que, por si mesmo, dentro de si, você não é aquele que de fora eu vejo. Não porque não quero. Eu queria que você estivesse pelo menos convencido disso. Você se conhece, se sente, se vê de uma maneira que não é a minha, mas a sua. E você acredita ainda que a sua maneira seja certa e a minha errada. Será... Não nego. Mas pode o seu jeito de ser o meu ou vice-versa?
Veja que voltamos ao início!
Eu posso crer em tudo que me dizem. É verdade. Te ofereço uma cadeira: sente-se e vejamos se chegamos a um acordo. Depois de uma boa meia horinha de conversa, nos entendemos perfeitamente.
Amanhã você retornará, com o dedo em riste, gritando:
- Mas como? O que você entendeu? Você não me disse isso e aquilo outro?
Isso e aquilo, perfeitamente. Mas o problema é que você, caro, nunca entenderá, nem eu nunca poderei te explicar como se traduz em mim aquilo que você me diz. Você não falou em turco, negativo. Usamos, eu e você, a mesma língua, as mesmas palavras. Mas que culpa temos, eu e você, se as palavras, em si, são vazias? Vazias, meu caro. E você as preenche com o seu sentido ao dizê-las a mim, e eu as recebê-las, inevitavelmente, as preencho com o meu sentido. Acreditamos de nos ter entendido, mas não nos compreendemos de fato.
Eh, esta história é velha, se sabe. E eu não pretendo dizer nada de novo, apenas torno a te perguntar:
-Mas por que então, santo Deus, você continua a fazer como se não soubesse? Falar-me de você, se você sabe que para ser para mim aquilo que você é para você mesmo e eu a você tal como sou para mim, seria necessário que eu, dentro de mim, te desse aquela mesma realidade que você dá a você e vice-versa, e isso, é possível?
Aí, caro, por mais que você fizesse, você me daria sempre uma realidade do seu jeito, mesmo acreditando de boa fé que seja o meu jeito, e será, não digo, quem sabe será, mas de um “meu jeito” que eu não conheço nem poderei nunca conhecer, o qual somente você que me vê de fora, conhece: então um “meu jeito” para você, não é um “meu jeito” para mim.
Se houvesse fora de nós, para você e para mim, se existisse uma senhora realidade minha e uma senhora realidade sua, digo, por si mesma, iguais e imutáveis. Mas não existe. Há em mim e para mim uma realidade minha, aquela que eu me dou e uma realidade sua em você e para você; aquela que você se dá, as quais não serão nunca as mesmas nem para você nem para mim.
E então? Então meu amigo, é necessário nos consolarmos com isso: que não é mais verdadeira a minha que a sua realidade e que duram apenas um momento tanto a sua como a minha.
Isso te confunde um pouco? Então assim... concluímos... (...)

Luigi Pirandello
Um, Nenhum e Cem mil, 2ºlivro – IV
(Luigi Pirandello, Uno, Nessuno e Centomila, Libro secondo – IV)

Traduzido por: Silvana G Melo

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